Alasca

    Não tive coragem de fazer caminhadas no Alasca, pois lá você não está no topo da cadeia alimentar, mas nem por isso me diverti menos. Alan (meu filho mais jovem, e companheiro de várias caminhadas) e eu pegamos um cruzeiro a partir de Vancouver e fomos para a natureza selvagem. Eu estava apreensivo sobre o cruzeiro, pois sou plugado em 220 volts e só de pensar em ficar 7 dias preso a um navio, me dava calafrios. Mas comecemos pelo início:
    Vancouver é linda. Mal cheguei e já me apaixonei por ela. É uma cidade diferente, jovem, vibrante, cheia de vida. Aterrisei dia 18/08/2009. O Alan já estava por lá, pois passou tres meses estudando alí.
    O melhor jeito de visitar o centro é a pé. Andamos pelas ruas comerciais, pelas residenciais, fomos à praia e ao Stanley Park. É um parque lindo, imperdível. Alugamos bicicletas e fomos pedalar. Uma delícia. Depois de quase duas horas, devolvemos as bikes e voltamos ao parque a pé. Vale a pena, pois a ciclovia passa por lugares diferentes da "pedestrevia".
    Dia seguinte fomos ao Deep Cove Park fazer uma caminhada. Deep Cove é um parque enorme. Só para se ter idéia, a sua trilha mais longa tem 41 quilômetros... Pegamos uma menorzinha, de 40 minutos subindo. Sempre subindo por uma floresta tipicamente canadense de pinheiros, totalmente diferente das nossas, até uma pedra de onde se tem uma vista maravilhosa do entorno. Os vancouverianos fazem esta trilha correndo, para treinar. Aliás, diferente dos Estados Unidos, em Vancouver não há pessoas gordas. E olhe que a diversidade por lá é realmente grande. Há asiáticos, árabes, europeus, um pouco de latinos e até canadenses. Como se diz por lá: "Canadense de Vancouver é Made in China".
    Dia seguinte fomos a Grouse Mountain. Este é um complexo magnífico tanto no inverno como no verão. Os mais valentes sobem a pé por uma escada de pedras e demoram entre 1 e meia e duas horas, e chegam totalmente sem fôlego. Alan tinha subido assim da primeira vez, mas desta subimos de teleférico mesmo. Há tanto o que fazer lá em cima que é difícil eu descrever aqui. Dê uma olhada em: http://www.grousemountain.com.
    Se você quiser só passear num maravilhoso jardim de flores, vá ao Queen Elizabeth Park. Ele tem um restaurante chique, mas se você quiser algo mais simples, leve sua própria comida e água, pois não tem absolutamente nada por perto. Mas vale a pena!
    Em resumo, Vancouver foi feita para a gente se apaixonar.

    Durante o cruzeiro, fiz uma espécie de diário que vou transcrever aqui. Se você não tiver paciência de ler um diário, pelo menos olhe as fotos. Valem a pena.
    Embarcamos dia 21/08, uma sexta feira. O Alan está triste. Saudades dos amigos que ficaram. Amigos de todo o mundo, que provavelmente ele não verá mais. Ele passou a noite toda se despedindo deles. Chegou ao hotel às 9:30 horas. Eu quase tive um enfarte, sem saber onde ele estava. Mas ele chegou na hora combinada para sairmos. Ele sempre chega.
    O check-in foi fácil e rápido. Incrível a organização para embarcar 2.000 pessoas. O navio partiu. As pessoas brindam, riem, fotografam-se umas às outras. Até parece que a partida sairá nas fotos... O Stanley Park ficou para trás, e vão todos comer. Aliás, acredito que esta seja a grande diversão a bordo. Não que eu não goste de comer, mas é realmente a única coisa que se tem para fazer. É só a primeira hora do primeiro dia, e eu acho, definitivamente, que isso não é para mim, nem para o Alan. Mas como estou preso por 7 dias, o melhor é tentar me divertir.
    Segundo dia. Ontem teve Cabalat Shabat. Éramos só uns 10, mas foi emocionante. O navio forneceu sidurim, kipot, velas, 2 chalot e vinho kasher. Lindo gesto. Hoje amanheceu chovendo. Fui ao fit tentar manter a forma. Fiz 15 minutos de esteira. O equilíbrio é difícil. Estamos em mar aberto e o navio joga que é uma beleza. Fico imaginando aqueles navios do século XVI, XVII nestes mares. E este tem 91.000 toneladas... O Alan foi ao cassino ontem e ganhou US$ 92,00 Quem sabe a sorte continua e pára de chover...
São 15:30 horas. Céu nublado. Um porre. O Alan disse que ele e eu estamos entre os mais magros do navio. De minha parte, não sei se é elogio... As pessoas pegam 3, 4 sobremesas. Só há velhos obesos.
    Entramos na Inside Passage. O navio parou de balançar, o enjoo terminou. Paisagem linda, florestas intocadas de pinheiros dos 2 lados. Fomos ao fit e à piscina aquecida. Uma delícia.
    Hoje é o primeiro jantar de gala. Todos vestem-se de terno e smoking, e depois vêm fazer uma boquinha onde Alan e eu estamos comendo de camiseta. Então prá que a gala?
    Ketchikan: Cidadezinha no meio do nada. As pessoas são extremamente simpáticas. Aliás, simpatia e aconchego é o que não falta neste fim de mundo. Segundo o Alan, os alasquenses são tão simpáticos porque eles são "made in Canada" e não nos U.S.A. Fizemos um self-guided walking tour. Vimos centenas (milhares?) de salmões subindo um rio com corredeiras enormes. Eles pulam e caem nas pedras, se debatem e o rio os leva de volta para baixo. Mas a natureza é incrível: lá vem eles de novo. E não desistem até conseguir subir o rio e desovar no lugar certo. E então, simplesmente morrem...
Em Ketchikan tem uma loja grande com as melhores roupas de caminhada, logo na saída do cais. E os preços são os mesmos de Chicago; portanto, se precisar, aproveite.
    Juneau: Adivinhe: chuva. Mas o dia foi maravilhoso. Descemos do navio e compramos uma viagem de helicóptero para um glaciar para brincar de trenó puxado por huskies alasquenses, para o período da tarde. Aliás, quando você reserva o cruzeiro, e a bordo também, eles fazem o possível para te vender passeios para a próxima parada (o navio navega durante a noite e passa o dia no porto). Jamais compre esses passeios no navio. Além de serem muito mais caros, você fica travado com o passeio, não importa o tempo que estiver fazendo. E logo ao desembarcar há inúmeras lojinhas de excursão no próprio cais, em qualquer porto. A chuva parou e aproveitamos a manhã para subir um morro de teleférico e lá em cima fazer uma trilha gostosa, sem pressa. Depois andamos pela cidade, linda, linda, toda florida. De volta ao navio para almoçar, afinal já estava pago mesmo, né?
    Às 14:15 horas em ponto fomos ao local de encontro, todos os 3: Alan, eu e a chuva. Chegados ao aeroporto, nos deram roupas impermeáveis para vestir sobre as nossas. E aí veio a pesagem. Éramos seis passageiros e o helicóptero é tão sensível que os lugares são distribuídos por pêso. E na balança uma placa enorme: "Blame your cruise". E lá fomos nós. O voo durou uns 20 minutos, com o piloto tentando controlar o aparelho e ao mesmo tempo nos mostrando e explicando as coisas lá de baixo. Quando batia uma rajada de vento, ele parava de falar (acho que começava a rezar) e puxava o manche totalmente para um lado, mas o bichinho insistia em ir a favor do vento. Emocionante... Chegamos ao glaciar onde moram 73 huskies alasquenses de corrida e 4 treinadores que se revezam a cada 7 dias, morando em barracas. O maior evento esportivo do Alasca é uma corrida de trenó puxado pelos huskies, de 1.200 milhas, dando volta em grande parte do estado, e estes estavam sendo  treinados para o evento. Os bichinhos são lindos e magrelas e a cada 10 minutos tínhamos que parar, pois eles começavam a sentir calor... A emoção foi tanta que nem sentimos a chuva aumentar de intensidade, a água passar pelas roupas impermeáveis e nós começarmos a congelar.
    Ao voltar para a cidade, Alan descobriu um bar que tinha Wi-Fi grátis, e após 3 dias sem contato com o mundo nos conectamos tomando cerveja. E que cerveja boa. Peça a Alaskan Amber, uma delícia. Que dia maravilhoso!!!
    Skagway: A cidade tem três quadras de largura por sete de comprimento. Simpática. Fizemos uma viagem de ônibus até o Canadá, e voltamos de trem.
    Icy Strait Point: Fica numa ilha perto da vila de Hoonah, que é uma vila indígena. A gente não chega à vila, mas os moradores fazem um show mostrando como eram os rituais indígenas no passado. Não fomos ao show. Como o lugar é muito pequeno, só um navio por vez pode chegar, e fica ao largo, pois o porto não tem calado para esses monstros. A gente vai à terra nos botes salva vidas, que ficam indo e vindo o dia todo. Logo ao desembarcarmos vimos uma baleia passeando por alí. De cara fomos à tirolesa. É a maior do mundo, com 1.600 metros de comprimento e a velocidade chega a 100 km/h. Demoramos 45 minutos de ônibus para chegar à rampa de lançamento, mais 30 minutos de explicações e fila, e lá fomos nós: 90 segundos de uma emoção incrível. Que delícia!
Como
a ilha tem 850 habitantes e 3.500 ursos, fomos a uma expedição de "bear search". Frustração. No bear, no bird, no nothing. Que dor de cotovelo de não termos ido à tirolesa novamente... Mas vai saber, né?
    Hoje haverá o segundo jantar de gala, e o garçom insistiu que a gente vá. Fomos de calça e camisa e ninguém reclamou. Teve lagosta. Eu prefiro camarão. O Alan perdeu US$ 50,00 no cassino.
    Hubard Glacier: Às 7 horas da manhã paramos em frente ao glaciar. Lindo. Deu saudades do Glaciar Torre (veja no site em Patagônia). O navio ficou uma hora indo e vindo pelo glaciar para que pudéssemos apreciá-lo por inteiro. Depois toca a pegar mar aberto. Mais um dia inteiro navegando. Que porre. O mar foi ficando cada vez mais agitado. À noite andávamos como bêbados, batendo nos dois lados do corredor. A noite foi terrível. Era necessário se segurar na cama para não cair. Houve uma hora que pensei que o navio fosse virar. Enfim chegamos a Seward, fim do cruzeiro.
    Seward: Cidadezinha perdida no fim do mundo. Tem um banco, um hospital, uma igreja, um corpo de bombeiros, uma delegacia, três gift shops, um café e um restaurante do qual a população pede comida para entregar em casa. A cidade funciona de maio a meados de setembro. E depois???
    De Seward a Fairbanks fomos de ônibus, com algumas paradas. A primeira foi num local onde se recolhe animais machucados ou órfãos, tratam deles e depois os levam para seu habitat. Foi aí que tivemos nossa segunda experiência com ursos, e a primeira com alces.
    No hotel de Alyeska pediram a identidade do Alan quando este pediu cerveja, o que o deixou muito frustrado, pois ele está cuidando e adubando uma barba para aparentar mais velho. Acordamos com frio e chuva e embarcamos rumo ao Denali, ao norte. Às 10 horas o sol reapareceu. Quente e gostoso. Na primeira parada saímos para nos aquecer. Que delícia. Mas na sombra faz um frio! Segundo nosso motorista, no verão há sol em junho e julho. Eles abençoam a chuva de agôsto, pois ela recupera as reservas de água e molha as plantas. Paramos em Anchorage para almoçar e curtir o sol. Chegamos ao Denali com sol e calor. A partir das 17 horas começa a esfriar, e ao por do sol, às 22 horas está realmente frio. Amanhã vamos ao parque e estamos torcendo por um dia bonito.
    Denali: Chuva e frio. Pegamos o ônibus para a entrada do parque. O motorista é um senhor aposentado do Kansas, que vem de lá até aqui, no final da primavera, dirigindo um carro-trailer, em sete dias. Aqui ele pega um summer job como motorista e em meados de setembro voltará para casa. Chegando ao parque tomamos o ônibus verde que nos levará por 3 horas e meia para dentro do parque, para tentarmos caminhar até uma geleira. O Denali é assim: um parque gigantesco com uma só estrada de terra que vai até metade dele. Somente ônibus, de dois tipos, podem entrar: o verde cuja passagem vale para qualquer ônibus verde, e você pode descer e subir à vontade, nos dois sentidos. No Denali não há trilhas, não há água nem comida. Você pede ao motorista para parar o ônibus, desce com sua tralha e vai "to the wild" na verdadeira acepção da palavra. E no dia que quiser, volta para a estrada e espera outro verde. E o branco que é para uma excursão do próprio parque, com guia, e você fica travado nele o tempo todo. O parque é completamente diferente de tudo que eu já vi.
Só existem duas regras: se encontrar um urso, não corra; se encontrar um alce, corra. E se encontrar os dois??? Na parte baixa tem árvores, não muito altas e distantes umas das outras. Na parte alta só há vegetação rasteira. Também, com temperaturas que no inverno chegam a -50° C... Mas as cores da vegetação no outono (sim, eles consideram final de agosto como outono) são de uma beleza de tirar o fôlego. As folhas passam de verde escuro para verde claro, amarelo, vermelho, tudo junto. É de arrepiar.
Bem, uns 20 minutos depois de embarcados no ônibus apareceu um urso, parou bem do nosso ladinho e pôs-se a cavocar o chão atrás de raízes. Apesar da chuva e do frio, o passeio foi muito bonito, pelas montanhas que de vez em quando apareciam, mas principalmente pelas cores. Chegando ao destino, frustração. A neblina era tanta que não dava para ver nada. Nós, e vários outros, tomamos um ônibus de volta.
Dizem que aqui dá para ver a aurora boreal. É só arranjar um lugar, à noite, sem luzes e sem nuvens...
Dia seguinte amanheceu lindo. O sol nos deu o prazer de sua presença. Voltamos ao parque, desta vez no ônibus branco. As cores ficaram muito mais intensas. Como era excursão, não pudemos sair por aí, o que não foi tão mau, pois outro urso apareceu passeando por alí. Afinal esta é a casa deles.
    Tudo no Alasca, lojas, restaurantes, hotéis, excursões funciona somente de maio a setembro. Quase todos os funcionários, guias, motoristas são recém formados que vêm para summer jobs e voltam ano a ano, até encontrarem trabalho em seu estado natal, ou se radicarem por aqui. Entre outubro e abril a população vai para Anchorage ou Fairbanks, com excessão dos autóctones, que permanecem onde moram. Pelas estradas existem cabanas destrancadas com lenha cortada e fósforos secos para abrigar algum trekker perdido no frio. Antes de sair, a pessoa corta lenha e deixa no lugar da que usou, para o próximo que por lá aparecer.
    Em tempo: Não perca tempo em Fairbanks. A cidade não tem nada para se fazer.
    Até a próxima.

                                                                                                                                Retornar à página inicial